09 dezembro 2016

DOMINGO DE MANHÃ

Saudação ao mar. Ernande, 2016.
Ernande Valentin do Prado

As seis horas entro no quarto e acordo Alice, como combinamos, vamos à praia. Ela acorda assustada, dá um pulo, resmunga fazendo careta.
- Não me olhe com essa cara, você me disse para lhe acordar.
- Mas precisava ser com cosquinha?
Agora posso me dar ao luxo de ir à praia aos sábados, domingos, feriados e até em alguns dias de trabalho. Não é tão perto quanto gostaria, ainda não escuto o som do vai e vem das ondas, mas consigo ir caminhando. Gosto de chegar cedo, antes dos vendedores, das pessoas que instalam guarda sol e cobram aluguel pelo uso.
- A praia é toda nossa, Alice.
- Eu sei, a gente é que deixa as outras pessoas entrar.
A gente carrega quase nada: uma bolsinha de pano, óculos, protetor solar, uma toalha de rosto (que cabe na mochila minúscula).
Na beira d’água Alice fica de biquíni e diz: “vamos dar um mergulho”. Entra na água e só sai na hora de fazer buraco na areia. Antes uma saudação ao mar, depois escrevemos desejos para o mar levar e mergulhamos.
- Olha pai, o homem da latinha chegou.
O homem da latinha é um galego, que sempre encontramos na praia de Tambaú. Sempre de braços abertos segurando uma latinha de cerveja.
O vendedor chega com seu filho, menino de 15 anos e uns 150 quilos, enquanto estamos na água. Para seu carrinho perto de nossas roupas. Arruma seus produtos, Alice Lê: “cerveja e água de coco”. Ele sai de guarda sol em guarda sol anunciando seus produtos, passa por nós, como se não nos visse. “Ele ignorou a gente, como pode”? Observa Alice. “Acho que ele já se acostumou com a gente”, tento consolar Alice.
- Você quer uma cerveja ou um Coco?
Pergunto para Alice, que não responde, apenas sorri e risca o chão cantarolando:
“Sou caipira bira bira bora
senhora  di aparecida
ilumina a mina escura
e funda o trêm da minha vida”
Voltamos para água. Alice ainda cantarolando:
“sou caipira bira bora nossa
senhora...”
- Eu sei rezar, sei orar. Vou rezar para aquele homem não se afogar.
Diz Alice apontando o homem que nada longe, rumo ao horizonte. Depois acrescenta:
- O mar tá (d)esvaziando.
Na saída do mar tomamos uma ducha no Bar Pé na Areia, que sempre achei que era Pé vermelho, mas talvez fosse só saudades do Paraná.

[Ernande Valentim do Prado é Enfermeiro
pai de Heloisa, Beatriz e Alice
publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

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