Saudação ao mar. Ernande, 2016. |
Ernande
Valentin do Prado
As
seis horas entro no quarto e acordo Alice, como combinamos, vamos à praia. Ela
acorda assustada, dá um pulo, resmunga fazendo careta.
-
Não me olhe com essa cara, você me disse para lhe acordar.
-
Mas precisava ser com cosquinha?
Agora
posso me dar ao luxo de ir à praia aos sábados, domingos, feriados e até em
alguns dias de trabalho. Não é tão perto quanto gostaria, ainda não escuto o
som do vai e vem das ondas, mas consigo ir caminhando. Gosto de chegar cedo,
antes dos vendedores, das pessoas que instalam guarda sol e cobram aluguel pelo
uso.
-
A praia é toda nossa, Alice.
-
Eu sei, a gente é que deixa as outras pessoas entrar.
A
gente carrega quase nada: uma bolsinha de pano, óculos, protetor solar, uma
toalha de rosto (que cabe na mochila minúscula).
Na
beira d’água Alice fica de biquíni e diz: “vamos dar um mergulho”. Entra na
água e só sai na hora de fazer buraco na areia. Antes uma saudação ao mar,
depois escrevemos desejos para o mar levar e mergulhamos.
-
Olha pai, o homem da latinha chegou.
O
homem da latinha é um galego, que sempre encontramos na praia de Tambaú. Sempre
de braços abertos segurando uma latinha de cerveja.
O
vendedor chega com seu filho, menino de 15 anos e uns 150 quilos, enquanto
estamos na água. Para seu carrinho perto de nossas roupas. Arruma seus
produtos, Alice Lê: “cerveja e água de coco”. Ele sai de guarda sol em guarda
sol anunciando seus produtos, passa por nós, como se não nos visse. “Ele
ignorou a gente, como pode”? Observa Alice. “Acho que ele já se acostumou com a
gente”, tento consolar Alice.
-
Você quer uma cerveja ou um Coco?
Pergunto
para Alice, que não responde, apenas sorri e risca o chão cantarolando:
“Sou
caipira bira bira bora
senhora di aparecida
ilumina
a mina escura
e
funda o trêm da minha vida”
Voltamos
para água. Alice ainda cantarolando:
“sou
caipira bira bora nossa
senhora...”
-
Eu sei rezar, sei orar. Vou rezar para aquele homem não se afogar.
Diz
Alice apontando o homem que nada longe, rumo ao horizonte. Depois acrescenta:
-
O mar tá (d)esvaziando.
Na
saída do mar tomamos uma ducha no Bar Pé na Areia, que sempre achei que era Pé
vermelho, mas talvez fosse só saudades do Paraná.
[Ernande
Valentim do Prado é Enfermeiro
pai de Heloisa, Beatriz e Alice
publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]
Nenhum comentário:
Postar um comentário
O que tem a dizer sobre essa postagem?